domingo, 19 de agosto de 2007

O primeiro que morre

Aqui do alto da minha arrogância te vejo aí em silêncio, tão baixo que mal posso definir teus traços. Tu te escondes na sombra, tenta desaparecer como uma criança triste que sempre é alvo de deboche na escola.
Eles apontam o dedo cruel e dão gargalhadas sonoras, e tu deixas porque pensa que é assim que tem que ser. Não questiona mais, não chora mais. Apenas baixa a cabeça na humildade que te ensinaram ter, esperando o dia da recompensa.
Aqui de cima vejo tudo e por um tempo tento pegar tua mão. Por um tempo tento te ensinar a olhar de frente, mas demoro a perceber que só conseguiria fazer isso se me agachasse e ficasse à tua altura. Os olhos ficariam frente a frente e aí sim tu teria a chance de compreender melhor as minhas palavras.
Mas não aprendo isso a tempo de salvar o que te resta. E tu estás mais disposto a continuar no mesmo chão, a contar formigas e promover-lhe chuva grossa de lágrimas.
E por não aprender isso a tempo, eu passo a caminhar mais alto. No caminho, não percebo mais onde piso, não vejo que chuto as pedras e destruo as paredes antes tão sólidas. Pois minha cabeça continua erguida e meus olhos, sempre voltados para dentro, não te vêem mais e não reconhecem tua forma. Como um animal que só percebe o movimento da sua presa, eu passo por ti sem notar, e posso até, vez ou outra, ter pisado nas tuas mãos apoiadas no chão, naquelas raras tentativas de se erguer.
A boa ação se transforma e pesa cada dia mais. Agora não vejo mais tanto sentido. Agora que meu peito congelou e minhas pernas se alongaram, não consigo mais te aquecer nem dobrar os joelhos.
Minha mente não está mais aqui e sempre que isso me causa dor, afasto o pensamento. O sol me agrada mais e teu toque desesperado de atenção me aflige, deprime, me faz pensar no lixo que varri para baixo do tapete e que está lá há tanto tempo que já começa a feder.
E talvez porque não haja uma saída honrosa, acabo afogando a melancolia em risos gratuitos, fingindo não ser necessário decidir. Não agora. Mas de agora em agora, caminho pelo corredor sem fim destruindo o pouco que resta da velha construção. Nem percebo que, no caminho, permiti que meus pés esmagassem as formigas e interrompessem sua trilha.
Isso te magoou, eu sei. Mas preferi ouvir música alta a ouvir tuas lamúrias. Não por que elas me chateiem, mas porque não tenho as respostas.
Ou talvez o que eu não tenha é a coragem de responder.

Um comentário:

Maikel De Abreu disse...

Eles apontam o dedo cruel e dão gargalhadas sonoras, e tu deixas porque pensa que é assim que tem que ser. Não questiona mais, não chora mais. Apenas baixa a cabeça na humildade que te ensinaram ter, esperando o dia da recompensa.

essa sequencia de jabs aki é foda!